Servidão aos Ícones

Uma coisa engraçada sobre os "mitos" do showbiz é o efeito que causam no gosto das gerações seguintes. Superestima-se muita gente, cujo maior mérito foi "apenas" ter sido destaque no contexto do qual faziam parte. As aspas devem-se à contradição de pensamentos que a constatação da frase anterior causa em mim, pois claro que a análise do contexto é essencial para atribuição de mérito; mas, ao mesmo tempo, penso que colocar esse aspecto acima do "agora" desbalanceia uma comparação com uma obra nova, desvalorizando-a. Até que ponto o envelhecimento da obra mais antiga não nos torna mais distantes, e, consequentemente, complacentes com suas eventuais falhas e limitações? Até que ponto isso não acentua em nós uma prevenção contra o novo, levando à conclusão inconsciente de que a arte morreu com o ícone?

Claro que a sobrevivência ao tempo pode ser um bom indício de que há qualidade em determinada obra, mas, ao mesmo tempo, até que ponto ela não se deve a sua própria mitificação, fazendo com que o gosto do coletivo prevaleça sobre o individual? É claro também que alcançar o status de ícone pressupõe o descobrimento do que precisava ser dito, mas como medir o ineditismo sem considerar a propaganda? Os ícones, em tese, "inventam", ou "reinventam" algo. Ok. Mas o que me incomoda é quando sinto que o mito é a invenção propriamente dita, uma imagem ou um conceito preso em si mesmo. Claro que há o outro lado também. Esquece-se de quem começou tudo, e olha-se pros mais vendidos de hoje como descobridores da pólvora - um caminho ainda mais perigoso, que leva ao hábito simplista de ver o meio do caminho como o início, como se desconstruir o passado fosse passar uma borracha sobre dele, só pra justificar a ignorância.

Não tenho a pretensão de trazer respostas, mas apenas de levantar e dividir esses questionamentos. Até porque, no final, a esperança - ingênua, eu sei - é a de que um dia o gosto coletivo realmente reflita o conjunto de gostos individuais, e não o da meia dúzia a quem é dado o poder de ditar o que é bom e eternizar padrões. Prefiro acreditar que a morte do ícone não mata o caminho; e que o maior legado do ícone não deve ser a apologia da nostalgia, e sim a passagem de bastão para a geração que o sucede, que deve recebê-lo com o compromisso de realmente levá-lo adiante.

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